Evangelho de Marcos | Estudo 5
Leitura Bíblica: Marcos 3:7-35
Vimos que no capítulo um do Evangelho de Marcos há cinco itens que são o conteúdo do serviço evangélico do Salvador-Servo: pregar o evangelho (Mc 1:14-20), ensinar a verdade (vs. 21-22), expulsar demônios (vs. 23-28), curar enfermos (vs. 29-39) e purificar leprosos (vs. 40-45). Também vimos em Marcos 2:1-28 e 3:1-6 cinco maneiras pelas quais o Salvador-Servo levou a cabo esse serviço evangélico: perdoar os pecados dos enfermos (2:1-12), comer com pecadores (vs. 13-17), fazer com que Seus seguidores se alegrem, sem ter de jejuar (vs. 18-22), importar-se antes com a fome de Seus seguidores do que com os preceitos da religião (vs. 23-28), importar-se antes com o alívio daquele que sofre do que com os ritos da religião (3:1-6). Em Marcos 3:7-35 temos outro grupo de cinco itens que são os atos auxiliares para o serviço evangélico: escapar do aperto da multidão (vs. 7-12), designar os apóstolos para pregar (vs. 13-19), deixar de comer por causa da necessidade urgente (vs. 20-21), amarrar Satanás e saquear-lhe a casa por meio do Espírito Santo (vs. 22-30) e não permanecer no relacionamento da vida natural, e sim no da vida espiritual (vs. 31-35). Em cada item dos três grupos vemos a excelência do Senhor Jesus. Nesta mensagem e na próxima, consideraremos os atos auxiliares para o serviço evangélico do Salvador-Servo.
ESCAPAR DO APERTO DA MULTIDÃO
Ao levar a cabo um ministério que Deus nos comissionou, encontramos problemas, oposição e estorvos. Certos problemas acontecem pelo que é feito de forma natural com a intenção de nos ajudar. O Senhor Jesus encontrou esse tipo de estorvo em Seu ministério. Enquanto levava a cabo o ministério de Seu serviço evangélico, Ele se deparou com problemas.
Em Marcos 3:7-12 temos o problema da multidão apertando o Senhor Jesus. O versículo 7 diz que grande multidão seguiu a Ele e aos discípulos, e no versículo 8 vemos que: “Uma grande multidão, ouvindo quantas coisas Jesus fazia, veio ter com Ele”. A multidão se reuniu a Sua volta porque haviam ouvido o que Ele fazia. Essa multidão foi um estorvo para o ministério do Senhor.
Muitos pregadores e evangelistas hoje gostam de ter grande multidão junto a si. Porém a multidão não é uma ajuda para o verdadeiro ministério de vida. Pelo contrário, no máximo pode ajudar-nos a ter um movimento, mas não ajuda o ministério em vida.
Apertar e Tocar:
Em Marcos 3:7-12 duas palavras significativas são usadas a respeito da multidão: apertar (vs. 9-10) e tocar (v. 10). O versículo 9 diz: “Então disse a Seus discípulos que Lhe tivessem pronto um barquinho junto Dele, por causa da multidão, a fim de não O apertarem”. O Senhor Jesus queria entrar num barco para evitar o aperto da multidão. O aperto impedia que os que eram sinceros viessem ao Senhor e O tocassem diretamente. Se estivermos entre os que meramente apertam o Senhor, não receberemos nada Dele. A fim de receber algo Dele, precisamos tocá-Lo. Portanto, nesse trecho do Evangelho de Marcos, a palavra apertar é usada no sentido negativo, enquanto tocar tem significado positivo.
De acordo com o registro dos Evangelhos, muitas vezes as pessoas apertaram o Senhor Jesus, mas somente os que O tocaram receberam algum benefício. É tocando diretamente o Senhor que a vida emana Dele para nós. A essa infusão de vida chamamos de transmissão. Outro termo é dispensação. Quando contatamos o Senhor diretamente, recebemos o dispensar divino. Mas apertar o Senhor não resulta em nada no que diz respeito ao dispensar divino que experimentamos apenas ao tocar diretamente o Senhor. Percebendo isso, Ele queria separar-se da multidão. Por essa razão retirou-se com os discípulos para o mar.
Um Barquinho:
Embora o Senhor Jesus se retirasse da multidão, ela continuava a segui-Lo. Por causa disso, mesmo na praia, a multidão procurava apertá-Lo. Assim, Ele disse aos discípulos que Lhe tivessem pronto um barquinho junto Dele. Ele não queria que a multidão O apertasse. O barco era um modo de estar separado da multidão.
Em figura, o barquinho que o Senhor Jesus queria que estivesse pronto junto Dele representa a igreja. Em Mateus 13 o barco tem esse significado. A igreja é diferente da nação de Israel, representada pela terra, e do mundo gentio, tipificado pela água. A igreja é algo separado da terra e está sobre a água. Portanto, ela não está nem na terra nem dentro d'água. Embora o “barco” da igreja esteja sobre a água, ele não está dentro dela nem ela dentro dele. Assim, a terra simboliza a nação de Israel, o mar prefigura o mundo gentio e o barco, separado tanto da terra como do mar, representa a igreja. Por meio disso podemos ver que a igreja. está separada tanto da nação de Israel como do mundo gentio. Esse entendimento está de acordo com a palavra de Paulo em 1 Coríntios 10:32 a respeito dos judeus, dos gentios e da igreja de Deus.
Hoje o Senhor Jesus ministra Sua vida para os que estão na igreja e de dentro da igreja ministra também para outros. Esse é o significado do barco. Se virmos isso, perceberemos que, fora da igreja, se tentarmos ministrar às pessoas, poderemos sofrer o aperto da multidão. Hoje muitos ministérios são transmitidos para a multidão, sem haver barco. Contudo, o ministério adequado é no barco, um ministério que infunde o suprimento de vida, não para os que apertam o Senhor Jesus, mas para os que sinceramente desejam tocá-Lo.
O que o Senhor Jesus fez em relação à multidão deve ser exemplo para nós, e devemos seguir Seus passos. Mas muitos pregadores e evangelistas hoje apreciam a multidão. Quanto maior a multidão, mais felizes eles ficam. Mas os fatos históricos indicam que grandes multidões causam perda e não benefício para o autêntico ministério de vida.
Aqui vemos que a maneira do Senhor é diferente da do homem. Em vez de gostar de multidão, Ele procurou evitá-la. Quando a multidão O seguiu, Ele pediu que Lhe tivessem pronto um barquinho a fim de se retirar da multidão que O apertava.
Receber o Ministério de Vida:
Embora o Senhor Jesus procurasse evitar a multidão, Ele queria que os que eram sinceros tivessem a possibilidade de tocá-Lo. Se formos apenas parte da multidão, não receberemos nada do Senhor. Precisamos distinguir-nos da multidão e tocá-Lo direta e honestamente. Se fizermos isso, receberemos o ministério de vida.
O primeiro dos atos auxiliares para o serviço evangélico do Salvador-Servo foi evitar o aperto da multidão. Com respeito a isso precisamos aprender com Ele. Freqüentemente os pregadores são enganados porque têm uma multidão a segui-los. Quando uma multidão nos circunda, isso pode ser enganoso e também um estorvo. Portanto, precisamos evita-la. Mas isso não quer dizer que devamos desistir das pessoas. Não; enquanto evitamos a multidão, precisamos deixar que outros nos contatem e nos toquem diretamente a fim de receber o genuíno ministério de vida.
Os Espíritos Imundos:
Marcos 3:11-12 diz: “E os espíritos imundos, quando O viam, prostravam-se diante Dele e gritavam: Tu és o Filho de Deus. E Jesus lhes advertia repetidamente que não O tornassem conhecido”. O que os demônios gritavam com relação ao Salvador-Servo era outro estorvo a Seu serviço evangélico. Por isso, Ele os advertia e os proibia.
DESIGNOU OS APÓSTOLOS PARA PREGAR
Vimos que o Salvador-Servo primeiro necessitou do mar e então de um barquinho para evitar o aperto da multidão, o que indica que isso era um estorvo para Seu serviço evangélico. Para escapar da multidão o Senhor Jesus foi ao mar. Mais tarde, foi do mar à montanha. As ações do Senhor aqui são muito interessantes. Para evitar o aperto da multidão, Ele foi ao mar, onde ministrou às pessoas sinceras que o tocaram diretamente. Por fim, depois que elas receberam Seu ministério de vida, Ele foi ao monte.
Marcos 3:13-15 nos diz por que o Senhor Jesus foi ao monte: “Depois subiu ao monte e chamou a Si os que Ele mesmo queria, e foram a Ele. E designou doze, aos quais deu também o nome de apóstolos, para estarem com Ele e para os enviar a pregar, e a ter autoridade para expulsar os demônios”. Aqui vemos que o objetivo de o Senhor Jesus subir ao monte era chamar alguns e fazê-los Seus apóstolos. Isso visava à expansão do serviço evangélico do Salvador-Servo.
De acordo com os versículos 14 e 15, os doze foram designados pelo Senhor Jesus para pregar o evangelho e expulsar demônios. Pregar o evangelho é ministrar Deus às pessoas; expulsar demônios é afastar Satanás delas. Esses dois itens constituem o principal objetivo do serviço evangélico do Salvador-Servo.
Segundo a Vontade do Pai Celestial:
O Evangelho de Lucas indica que o Senhor Jesus orou antes de designar os doze apóstolos: “Aconteceu, naqueles dias, que Ele saiu para o monte a fim de orar, e passou a noite toda em oração a Deus. E quando amanheceu, chamou a Si os Seus discípulos e escolheu doze dentre eles, aos quais deu também o nome de apóstolos” (Lc 6:12-13). Muitos haviam recebido o ministério de vida do Senhor Jesus. Isso significa que Ele tinha suprido muita vida às pessoas sinceras que O tocaram diretamente e elas receberam Seu suprimento de vida. Então Ele teve encargo de escolher alguns e designá-los para ajudá-Lo em Seu ministério evangélico. Por essa razão, Ele foi ao monte e orou. Lucas indica que o Senhor orou a noite toda. O Senhor deve ter orado a respeito da escolha dos doze apóstolos entre os muitos que receberam Seu ministério de vida.
Sabemos que um dos doze escolhidos pelo Senhor Jesus foi Judas Iscariotes, que O traiu (Mc 3:19). Na verdade o Senhor Jesus sabia que Judas iria traí-Lo. Creio que antes de fazer a escolha, o Senhor Jesus consultou o Pai em oração. A designação dos doze, na verdade, não foi a execução da Sua vontade, e sim a vontade de Deus Pai. Creio que o Pai O encarregou de escolher alguns, inclusive Judas. O Senhor Jesus fez Sua escolha de acordo com a vontade do Pai celestial.
Aprender a Levantar Outros:
Precisamos aprender com o Senhor Jesus a não levar a cabo nosso ministério por nós mesmos. Nem mesmo o Senhor Jesus levava a cabo Seu ministério por Si mesmo. Primeiro Ele escolheu os doze e mais tarde, os setenta. Com isso vemos que tanto no ministério como na vida da igreja precisamos aprender a ser diligentes e fiéis, e também a levantar alguns que nos ajudem.
Não é muito difícil levar a cabo nosso ministério por nós mesmos. Na realidade, existe a tendência de que mestres e pregadores façam tudo sozinhos. Entre os cristãos hoje não há o costume de compartilhar o ministério com outros, de ensinar, designar e aperfeiçoar outros para cumprir o mesmo ministério. Mas, de acordo com a palavra de Paulo em Efésios 4, o ministério dos apóstolos, profetas, evangelistas, e pastores e mestres visa ao aperfeiçoamento dos santos, a fim de que levem adiante a obra do ministério. O ministério do Senhor era aperfeiçoar os apóstolos, e o dos apóstolos era aperfeiçoar os santos. Por meio disso vemos que o mover de Deus na terra não é com indivíduos, mas com grupos de pessoas.
Nos Evangelhos primeiramente temos um grupo de doze e mais tarde outro de setenta. A designação dos apóstolos para pregar certamente é um ato auxiliar significativo para Seu serviço evangélico. Todos precisamos seguir o Senhor Jesus nessa questão. Os presbíteros numa igreja precisam aprender a levantar outros. Após um período, os presbíteros não devem mais estar sozinhos no cuidado da igreja; devem levantar outros que se unam a eles nessa responsabilidade.
Não a Visão Natural, mas a Visão segundo a Percepção Espiritual:
No início do Seu ministério, o Senhor Jesus escolheu os doze, que certamente não eram muito maduros. Dois deles, Tiago e João, filhos de Zebedeu, receberam o nome de Boanerges, que significa filhos do trovão. A palavra grega Boanerges vem do aramaico. Esse nome foi acrescentado a Tiago e a João pelo Senhor, devido à impetuosidade deles (ver Lc 9:54-55; Mc 9:38). No capítulo nove de Marcos temos um exemplo do “trovejar” de João. Mas, quando ele escreveu seu Evangelho, as Epístolas e Apocalipse o trovejar perdeu o barulho.
Outro entre os doze escolhidos pelo Senhor Jesus foi Simão, o cananeu (Mc 3:18) . A palavra cananeu vem do hebraico kanná, zeloso. Isso se refere a uma seita da Galiléia conhecida como os zelotes; não se refere à terra de Canaã (Lc 6:15; At 1:13). Os zelotes eram extremamente patrióticos e amavam as tradições e práticas judaicas. O Senhor Jesus escolheu um deles para ser apóstolo.
Um dos doze, Mateus, havia sido cobrador de impostos. Em sua lista dos doze apóstolos Mateus especificamente se designa como o cobrador de impostos (Mt 10:3). Isso provavelmente indica que ele se lembrava de sua salvação com gratidão. Até mesmo um cobrador de impostos, desprezado e pecador, podia tornar-se apóstolo do Salvador-Servo.
O último dos doze mencionados por Marcos é Judas Iscariotes. O termo Iscariotes, uma palavra grega, provavelmente vem do hebraico e significa homem de Queriote. Queriote ficava em Judá (Js 15:25). Assim, Judas era o único apóstolo da Judéia, todos os outros eram galileus.
Ao considerar que irmãos podem ser presbíteros numa igreja, pode parecer-nos que nenhum está qualificado. Por exemplo, talvez digamos: “Esse irmão parece ser muito bom e ama bastante o Senhor. Mas e seus antecedentes?”. Se o Senhor Jesus tivesse considerado os doze dessa forma, quem poderia ser escolhido? Mateus certamente seria excluído. Como poderia o Senhor Jesus escolher um cobrador de impostos para ser um dos doze apóstolos? Podemos pensar que o Senhor Jesus deveria ter escolhido um escriba. Mas um dos que Ele escolheu foi, de fato, cobrador de impostos.
Precisamos aprender com o Senhor Jesus que a visão natural é diferente da visão segundo a percepção espiritual. O Senhor Jesus fez Sua escolha de acordo com a percepção espiritual, e não de acordo com o ponto de vista humano natural. Tiago e João tinham temperamento terrível, capaz de trovejar. Nós nunca os teríamos escolhido para apóstolos, mas o Senhor os escolheu. Do ponto de vista natural, ninguém estaria qualificado para ser apóstolo do Senhor Jesus. Tiago e João, Simão, o Zelote, Mateus, o cobrador de impostos — nenhum deles estaria qualificado. Louvado seja o Senhor que Ele não fez a escolha de acordo com o ponto de vista natural!
Com uma visão natural dos irmãos na vida da igreja, podemos pensar que somos os únicos qualificados para fazer certas coisas. Por exemplo, pode haver apenas um presbítero em certa cidade. Talvez ele diga que há a necessidade de pelo menos mais dois. Porém ele pode dizer também: “Sim, tal irmão de certa forma é bom. Mas não é tão bom”. Finalmente, de acordo com o ponto de vista natural, apenas ele mesmo é qualificado. Podem passar-se anos e ele permanecer como o único que parece adequado para assumir a responsabilidade do presbitério. Não há “os doze”, muito menos “os setenta”, para ajudá-lo. Ele acha que é o único em sua igreja qualificado para ser presbítero. Mas o Senhor Jesus escolheu os desqualificados para apóstolos. Os doze não eram qualificados e nós também não o somos. Contudo, no mover do Senhor há a necessidade de ajudantes; por isso, um dos atos auxiliares do Senhor para levar a cabo Seu ministério foi escolher alguns desqualificados para apóstolos.
Finalmente, Pedro foi confirmado pelo que aconteceu no dia de Pentecostes. Não creio que ele tivesse alto grau de instrução. Contudo, pouco depois de o Senhor Jesus ter sido crucificado e ressuscitado, ele pôde levantar-se no dia de Pentecostes como o apóstolo líder. Pedro era um pescador escolhido pelo Senhor Jesus e então confirmado no dia de Pentecostes.
É muito importante que aprendamos a não ver o ministério do Senhor ou a igreja de acordo com o conceito natural. O Senhor Jesus não escolheu Nicodemos para ser um dos doze; não escolheu nenhum de muita instrução. Pelo contrário, os que escolheu pareciam meio esquisitos. Vimos que para Tiago e João Ele até mesmo deu o nome de “filhos do trovão”. Freqüentemente quando falavam, eles trovejavam. Se estivéssemos lá, talvez nossa atitude fosse: “Coloque esses dois de lado até que parem de trovejar. Uma vez que tenham mudado e seu trovão tenha perdido o barulho, então poderemos usá-los no ministério”. Esse é nosso conceito, o conceito natural, mas não é o ponto de vista do Senhor Jesus. Em sua cidade você é capaz de usar os filhos do trovão no serviço da igreja? Precisamos aprender do Senhor a usar até mesmo esses no serviço evangélico.
Vimos que o Senhor Jesus retirou-se da multidão e então pediu que tivessem pronto um barquinho para Ele. Ele não agia de modo natural; tudo o que fazia era no espírito. Semelhantemente, a designação dos doze não foi natural, mas totalmente no espírito. Embora soubesse que Judas iria traí-Lo, Ele ainda o designou como um dos doze. Naturalmente falando, ninguém designaria alguém como Judas. Mas, agindo pelo Espírito, o Senhor Jesus escolheu até mesmo Judas.
DEIXAR DE COMER POR CAUSA DA NECESSIDADE URGENTE
Marcos 3:20-21 diz: “E Jesus entrou numa casa. E ajuntou-se de novo a multidão, de tal modo que nem podiam comer. E quando Seus parentes ouviram isso, saíram para O prender; porque diziam: Está fora de Si”. Isso indica quão ocupado, diligente e fiel era o Salvador-Servo como Servo de Deus em Seu serviço evangélico.
Não é fácil analisar ou sistematizar as ações do Senhor Jesus. Parece haver uma contradição entre Seu comportamento de evitar a multidão em Marcos 3:7-12 e Sua atitude em Marcos 3:20-21. Primeiro Ele evitou a multidão, mas, quando estava em casa e a multidão se ajuntou, Ele não tentou se retirar dela. Pelo que tinha feito em Marcos 3:7-12, era de se esperar que se mantivesse afastado da multidão a fim de acabar de comer. Esperaríamos que Ele dissesse: “Estou comendo agora, não tenho tempo para estar com vocês”. Mas Ele agiu de forma diferente: parou de comer e cuidou da necessidade urgente dos que estavam na multidão.
Quando os parentes do Senhor Jesus ouviram falar dessa situação, saíram para O prender, dizendo que Ele estava fora de Si. Essa exclamação expressava a preocupação natural dos parentes do Salvador-Servo. Como veremos na próxima mensagem, isso abriu a porta para que os escribas blasfemassem Dele (Mc 3:22). Os parentes do Senhor Jesus, talvez Seus irmãos na carne, pensaram que Ele estivesse fora de Si. Estavam preocupados porque Ele só atentava para a multidão e não para Sua alimentação.
Não devemos tentar analisar de forma natural o que parece ser um comportamento contraditório do Senhor Jesus. Quando a multidão O apertou, Ele procurou evitá-la. Mas, quando ela Lhe proporcionou oportunidades de ministrar vida, Ele não se preocupou com a própria alimentação. Precisamos discernir essas duas questões: o aperto da multidão e a oportunidade de ministrar vida.
Em Marcos 3:7-35 vemos cinco atos auxiliares para o serviço evangélico do Salvador-Servo: escapar do aperto da multidão (vs. 7-12), designar os apóstolos para pregar (vs. 13-19), deixar de comer por causa da necessidade urgente (vs. 20- 21), amarrar Satanás e saquear-lhe a casa por meio do Espírito Santo (vs. 22-30), e não permanecer no relacionamento da vida natural, e sim no relacionamento da vida espiritual (vs. 31-35). Já consideramos os primeiros três desses atos auxiliares. Agora consideraremos os dois últimos: amarrar Satanás e não permanecer no relacionamento da vida natural.
AMARRAR SATANÁS E SAQUEAR-LHE A CASA PELO ESPÍRITO SANTO
De acordo com Marcos 3:21, os parentes do Senhor Jesus “saíram para O prender; porque diziam: Está fora de Si”. Essa exclamação, expressando a preocupação natural dos parentes do Salvador-Servo, abriu a porta para que os escribas O blasfemassem. O versículo 22 diz: “Os escribas que haviam descido de Jerusalém diziam: Ele-está possesso de Belzebu, e: É pelo príncipe dos demônios que Ele expulsa os demônios”. Essa foi uma palavra de blasfêmia, causada pela expressão da preocupação natural no versículo 21. Por não conseguir entendê-Lo, os parentes do Senhor Jesus disseram que Ele estava fora de Si. Essa palavra abriu a porta para que os escribas, os opositores, difamassem o Senhor. Os escribas poderiam ter dito: “Veja, até mesmo Seus parentes dizem que Ele está fora de Si. Você sabe por que ele está fora de si? É porque tem demônio, e esse demônio é Belzebu, o príncipe dos demônios”. O Salvador-Servo expulsava demônios, os obreiros malignos do reino das trevas de Satanás; contudo, os opositores disseram que Ele o fazia pelo príncipe dos demônios. Que sutileza do maligno, que motivou esses opositores malignos a dizer isso! Esses religiosos opositores eram cooperadores de Satanás e até mesmo eram um com ele.
Baal-Zebube significa o senhor das moscas, o nome de um deus dos ecronitas (2Rs 1:2). Os judeus com desdém mudaram o nome para Belzebu, que significa senhor do monte de esterco e era usado para o príncipe dos demônios (Mt 12:24; Lc 11:15, 18-19). Os escribas insultaram o Salvador-Servo dizendo que Ele expulsava os demônios pelo príncipe dos demônios. Esse nome extremamente blasfemo expressava a mais forte objeção e rejeição deles.
Sem dúvida, o nome Belzebu se refere ao diabo. O diabo é senhor das moscas e senhor do monte de esterco. Os escribas não poderiam ter escolhido termo pior para difamar o Senhor Jesus. Eles não apenas disseram que Ele tinha demônio, mas estava sob a autoridade de Belzebu, o maioral dos demônios. Essa blasfêmia é tão séria que o Senhor Jesus indicou que é imperdoável, pois é blasfêmia contra o Espírito Santo (Mc 3:28-30). Afirmar que o poder (a obra e a autoridade) do Espírito Santo é o poder (a obra e a autoridade) de Belzebu é pecar contra o Espírito Santo. Precisamos lembrar que a palavra dos parentes do Senhor Jesus é que abriu a porta para tal difamação, a palavra de que Ele estava fora de Si. Eles o acusaram de ser anormal, e isso deu aos escribas oportunidade para difamá-Lo. Os escribas talvez tenham dito: “Ele certamente é anormal, pois tem demônio, Belzebu”. Por meio disso podemos ver que a porta para Satanás pode ser aberta pelo amor natural dos parentes por nós.
Marcos 3:23-25 diz: “Jesus, tendo-os chamado a Si, dizia-lhes em parábolas: Como pode Satanás expulsar a Satanás? Se um reino estiver dividido contra si mesmo, tal reino não pode subsistir; se uma casa estiver dividida contra si mesma, tal casa não poderá subsistir”. A palavra do Senhor Jesus aqui indica que Satanás não somente possui uma casa, mas também um reino. Sua casa é uma casa de pecado (1Jo 3:8, 10), e seu reino, de trevas (Cl 1:13). Os pecadores pertencem tanto à sua casa como ao seu reino. Os demônios pertencem ao seu reino, e para esse reino se apoderam das pessoas. Satanás é o príncipe deste mundo (Jo 12:31) e o príncipe da potestade do ar (Ef 2:2). Ele tem sua autoridade (At 26:18) e seus anjos (Mt 25:41), que são seus subordinados como principados, potestades e dominadores deste mundo tenebroso (Ef 6:12). Portanto, ele tem o próprio reino: a autoridade das trevas (Cl 1:13). Vimos que Satanás tem tanto uma casa como um reino. O reino de Satanás é contrário ao reino de Deus, e a casa de Satanás é contrária à casa de Deus.
Em Marcos 3:26, o Senhor Jesus mostra que se “Satanás se levantou contra si mesmo, e está dividido, não pode subsistir, antes é chegado o seu fim”. Então Ele continua no versículo 27: “Ninguém pode entrar na casa do homem forte e saquear-lhe completamente os bens se primeiro não amarrar o homem forte; e então lhe saqueará completamente a casa”. Os bens aqui são os pecadores mantidos na casa de Satanás para seu reino. O Salvador-Servo amarrou Satanás, o homem forte, e entrou em sua casa para saquear-lhe os bens, para que os pecadores, pela regeneração, fossem introduzidos na casa de Deus (Ef 2:19) no reino de Deus (Jo 3:5). Enquanto realizava Seu serviço evangélico, o Salvador-Servo amarrava o homem forte, Satanás. O serviço evangélico é uma guerra para destruir Satanás e seu reino de trevas.
A palavra do Senhor Jesus no versículo 27 indica que, enquanto pregava o evangelho, Ele estava amarrando o homem forte a fim de destruir seu reino saqueando-lhe a casa. Em outras palavras, a pregação do Senhor Jesus era um saquear. Satanás capturou todos os pecadores e os colocou em sua casa, que é uma prisão. Assim, todos os pecadores se tornaram seus cativos. Mas o Senhor Jesus, que tem o poder do Espírito, veio para pregar o evangelho. Veio saquear a casa de Satanás e libertar os cativos.
Se não tivéssemos a palavra do Senhor Jesus registrada no versículo 27, não iríamos perceber que quando pregamos o evangelho devemos saquear a casa de Satanás. Talvez pensemos que a pregação do evangelho seja simplesmente ganhar almas, salvar pecadores perdidos. O Senhor, contudo, tem um conceito diferente: pregar o evangelho para salvar pecadores é saquear a casa de Satanás para libertar os cativos. Para ser exato, esse saquear destrói o reino de Satanás.
A palavra em Marcos 3:27 corresponde ao que o Senhor Jesus diz a Paulo em Atos 26:18: “Para lhes abrires os olhos e os converteres das trevas para a luz e da potestade de Satanás para Deus”. Quando Paulo foi chamado por Deus para pregar o evangelho, foi-lhe dito que convertesse as pessoas das trevas para a luz, e da autoridade de Satanás para Deus. A autoridade de Satanás é simplesmente seu reino. Hoje, quando pregamos o evangelho aos pecadores, também devemos converter os cativos de Satanás da autoridade das trevas para Deus e Seu reino.
Em Marcos 3:28-29, o Senhor Jesus também disse aos escribas: “Em verdade vos digo que todos os pecados serão perdoados aos filhos dos homens, e quaisquer blasfêmias que proferirem. Aquele, porém, que blasfemar contra o Espírito Santo não tem perdão para sempre, mas é réu de pecado eterno”. A palavra do Senhor Jesus aqui a respeito do Espírito Santo mostra que o serviço evangélico do Salvador-Servo, especialmente ao expulsar demônios para destruir o reino tenebroso de Satanás, dava-se pelo Espírito Santo, com quem Ele foi ungido e por quem era guiado continuamente em Seu mover (Lc 4:18, 1; Mc 1:12).
Ao pregar o evangelho, o Senhor Jesus estava destruindo o reino de Satanás pelo poder do Espírito Santo. Ao tempo de Seu batismo Ele negou a Si mesmo, tendo sido sepultado nas águas de morte. O Senhor Jesus não fazia nada pelo próprio poder, força ou energia; pelo contrário, fazia tudo pelo Espírito Santo. Em especial, pelo Espírito Santo Ele pregou o evangelho, a fim de saquear a casa de Satanás e destruir-lhe o reino.
Mateus 12:28 mostra que ao destruir o reino de Satanás pela pregação do evangelho, o Senhor Jesus estava introduzindo o reino de Deus: “Se, porém, Eu expulso os demônios pelo Espírito de Deus, então é chegado o reino de Deus sobre vós”. O Espírito de Deus é o poder do reino de Deus. Onde está o Espírito de Deus em poder, aí está o reino de Deus, e aí os demônios não têm vez.
Quão maravilhoso é o ato auxiliar para o serviço evangélico do Salvador-Servo descrito em Marcos 3:22-30! Pelo que é retratado aqui, aprendemos que quando pregamos o evangelho precisamos orar para contatar a Deus como nossa fonte a fim de receber mais do Espírito Santo e ser por Ele fortalecidos com poder. Então, ao pregar o evangelho, iremos saquear a casa de Satanás e destruir-lhe o reino. Isso é grandioso, e é muito importante que todos o vejamos.
O serviço evangélico não se restringe a pregar; também envolve lutar e saquear. Os pecadores são os “bens” capturados por Satanás e mantidos na fortaleza de sua casa. Portanto, os incrédulos não apenas precisam ser convencidos e subjugados, mas também a casa de Satanás precisa ser saqueada a fim de que eles possam ser libertos do cativeiro. Para libertar os cativos de Satanás, precisamos de poder e autoridade. O Espírito Santo é nosso poder e autoridade. Por meio do ato auxiliar do Senhor aqui, percebemos nossa necessidade de ser fortalecidos com poder pelo Espírito Santo para pregar o evangelho.
Em Marcos 3:28-29 o Senhor Jesus diz que todos os pecados e blasfêmias serão perdoados aos filhos dos homens, mas quem blasfemar contra o Espírito Santo “não tem perdão para sempre, mas é réu de pecado eterno”, um pecado que não será perdoado para sempre. A blasfêmia contra o Espírito Santo difere de ultrajar ou insultar o Espírito (Hb 10:29). Insultar o Espírito é desobedecê-Lo voluntariamente. Muitos crentes fazem isso. Se confessarem esse pecado, serão perdoados e purificados pelo sangue do Senhor Jesus (1Jo 1:7, 9). Mas blasfemar contra o Espírito Santo é difamá-Lo, como os escribas o fizeram em Marcos 3:22. Foi pelo Espírito Santo que o Senhor Jesus expulsou o demônio, mas os escribas, ao vê-lo, disseram que Ele o fazia por Belzebu, maioral dos demônios. Isso foi uma blasfêmia contra o Espírito Santo.
Na economia do Deus Triúno, o Pai concebeu o plano de redenção (Ef 1:5, 9), o Filho cumpriu a redenção de acordo com o plano do Pai (1Pe 2:24; Gl 1:4) e o Espírito alcança os pecadores para aplicar a redenção efetuada pelo Filho (1Co 6:11; 1Pe 1:2). Se um pecador blasfemar contra o Filho, assim como o fez Saulo de Tarso, o Espírito ainda tem como trabalhar nele e fazê-lo arrepender-se e crer no Filho a fim de ser perdoado (ver 1Tm 1:13-16). Mas se um pecador blasfemar contra o Espírito, o Espírito não terá base para trabalhar nele, e assim não haverá mais ninguém que possa fazê-lo arrepender-se e crer. Logo, é impossível tal pessoa ser perdoada. Isso não é somente lógico, de acordo com a razão, mas também é governamental, segundo o princípio administrativo de Deus, como é revelado aqui pela palavra do Senhor.
NÃO PERMANECER NO RELACIONAMENTO DA VIDA NATURAL, E SIM NO DA VIDA ESPIRITUAL
Em Marcos 3:31-35 vemos o quinto ato auxiliar para o serviço evangélico do Salvador-Servo: não permanecer no relacionamento da vida natural, e sim no da vida espiritual. Marcos 3:31-32 diz: “Chegaram então Sua mãe e Seus irmãos, e, ficando do lado de fora, mandaram chamá -Lo. Uma multidão estava assentada ao redor Dele, e Lhe disseram: Eis que Tua mãe, Teus irmãos e Tuas irmãs estão lá fora e Te procuram”. Depois da blasfêmia dos opositores instigada por Satanás, os parentes do Salvador-Servo vieram novamente perturbá-Lo com sua preocupação natural por Ele. Sem dúvida, isso também foi motivado pelo maligno.
De acordo com os versículos 33 a 35, o Senhor Jesus disse: “Quem é Minha mãe e Meus irmãos? E, olhando em redor para os que estavam assentados à Sua volta, disse: Eis Minha mãe e Meus irmãos! Porque qualquer que fizer a vontade de Deus, esse é Meu irmão, irmã e mãe”. A palavra do Senhor Jesus aqui indica que Ele rejeitou a preocupação natural dos parentes. Para derrotar os ardis do maligno e cumprir Seu serviço evangélico, Ele se recusou a manter qualquer relacionamento na vida natural. Isso demonstrou que Ele, em Sua humanidade, era absoluto para Deus.
Olhando em redor para os que estavam assentados à volta, o Senhor Jesus disse: “Eis Minha mãe e Meus irmãos!”, depois disse também que qualquer pessoa que fizesse “a vontade de Deus, era Seu irmão, irmã e mãe”. Aqui vemos que o relacionamento do Senhor Jesus com Seus seguidores não é na carne, mas no espírito. Qualquer que fizer a vontade de Seu Pai é Seu irmão para ajudar, irmã para se solidarizar e mãe para amar ternamente.
Por meio de Seu serviço evangélico, o Salvador-Servo fez dos pecadores que Nele creram Seus parentes espirituais. Estes se tornaram Seus muitos irmãos (Rm 8:29; Hb 2:11) na casa de Deus (Hb 3:5) e Seus muitos membros para a edificação de Seu Corpo místico (Ef 5:30; 1Co 12:12), a fim de fazer a vontade de Deus.
Hoje a igreja católica romana considera Maria a mãe de Deus. Mas aqui o Senhor Jesus negou Seu relacionamento natural com ela e disse que quem fizer a vontade de Deus é Sua mãe. Isso quer dizer que uma irmã que faz a vontade de Deus pode ter a ousadia de declarar que é mãe para o Senhor Jesus. Além disso não é presunção nossa dizer com ousadia que somos Seus irmãos.
Em Marcos 3:31-35 vemos que o Senhor Jesus não permaneceu no relacionamento da vida natural, mas Seu relacionamento com Seus seguidores era da vida espiritual. A partir desse ato auxiliar podemos ver que, para ser poderosos no ministério de Deus, precisamos negar os relacionamentos naturais. O maior obstáculo para o ministério de Deus é o relacionamento natural com pai ou mãe, esposo ou esposa, filhos ou parentes. O Senhor Jesus evitou esse obstáculo negando o relacionamento natural.
Nesses cinco atos auxiliares para o serviço evangélico do Salvador-Servo, vemos que não há base para o conceito, entendimento ou relacionamento natural. Nesses atos auxiliares tudo é espiritual, santo e divino, totalmente contrário ao conceito humano. Se quisermos seguir o Senhor Jesus a fim de ter esses atos auxiliares hoje, não devemos dar margem aos conceitos ou relacionamentos naturais. Para seguir o Senhor Jesus nessas questões, tudo deve ser espiritual, divino, santo e de acordo com Deus. Então teremos a base e a ousadia para levar a cabo a obra de Deus.
Espero que todos, especialmente os jovens, sejamos ajudados e impressionados por meio desses atos auxiliares para o serviço evangélico do Senhor. Principalmente, precisamos ser impressionados para nunca considerar a restauração, o ministério e o mover do Senhor de maneira natural. Não devemos medir o mover do Senhor segundo o nosso entendimento natural.
Todos os fatos registrados no Evangelho de Marcos ocorreram debaixo da soberania do Senhor. Primeiro, em Marcos 1:14-45 temos cinco questões que formam o conteúdo do serviço evangélico do Salvador-Servo. Então, em Marcos 2:1-3:6 temos cinco incidentes que mostram as maneiras pelas quais Ele levou a cabo esse serviço evangélico. Também vimos que há cinco atos auxiliares em Marcos 3:7-35. Esses cinco casos, cinco incidentes e cinco atos aconteceram, pela soberania de Deus, numa seqüência excelente. Se virmos isso, saberemos como levar a cabo o ministério de Deus. Se virmos o conteúdo, as maneiras e os atos, saberemos o que é o serviço evangélico do Senhor, saberemos levar a cabo esse serviço e saberemos ter a base e a posição para realizar a obra de Deus.
Jesus é o Senhor!